EFEITOS
CIVIS DA SENTENÇA CRIMINAL - DE LEGE FERENDA
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Autor: Roberto
de Abreu e Silva
Desembargador do Tribunal de Justiça do Estado do Rio de
Janeiro e Professor da EMERJ.
Publicação autorizada por especial deferência da Revista
da Escola da Magistratura do Estado do Rio de Janeiro - EMERJ - www.emerj.jr.gov.br -
extraída do vol. 10 , nº. 39, págs. 17-30. |
1
- VINGANÇA PRIVADA, CLEMÊNCIA REMUNERADA E COMPOSIÇÃO
LEGAL
A
evolução da obrigação de reparar os danos gerados por crimes no direito
antigo passou por três períodos distintos que podem ser cognominados
de vingança privada, clemência remunerada e de composição legal. Nas
sociedades primitivas, prevalecia a idéia de repressão ao crime por
meio de infligência de mal análogo ao praticado pelo infrator, no período
da vingança privada e familiar oriunda da doutrina da pena de Talião.
Impunha-se como castigo a expiação do próprio corpo do lesante por
violação da norma jurídica em proporção igual ao dano causado, na medida
de: olho por olho, dente por dente, sangue por sangue etc. A sanção
desse período não gerava a indenização dos danos causados à vítima
pelo responsável legal, fazendo permanecer no tempo as insatisfações
contidas que fomentavam vinganças sucessivas. A vingança privada, mais
tarde, arrefecida pela influência religiosa sobre os povos, cedeu lugar
ao espírito de clemência remunerada.
O
segundo período inicia-se nessa fase da substituição da pena de Talião
pela clemência remunerada, época em que o devedor cumpria a sua obrigação
por meio de reparação pecuniária do dano causado à vítima. A lei romana
das XII Tábuas, nesse tempo, conti-nha numerosos exemplos de composições
e de penas privadas que impediam o lesado de recorrer à vingança privada,
para o exercício de seu direito à reparação dos danos. O sistema de
composição voluntária, dessa época, tinha um caráter penal e não civil,
na medida em que o direito deixava ao arbítrio das partes acordarem
na solução do conflito de interesse privado, como aconteceu durante
longo tempo no povo germânico.
No
direito romano antigo, os delitos eram classificados como públicos
e privados, conforme a lesividade do ato atingisse os interesses sociais
ou particulares. As sanções dos delitos públicos eram penas corporais
ou pecuniárias que, em nada, às vítimas dos ilícitos aproveitavam.
Os delitos privados, por sua vez, ensejavam indenizações em proveito
das vítimas, desde que os lesados as pedissem aos pretores. Na lição
de José Carlos Moreira Alves, em um período mais moderno do direito
romano, as ações foram classificadas em: reipersecutórias, penais e mistas:
a) reipersecutórias quando eram originárias de contratos. A
ação tinha como objetivo a devolução da coisa devida ou indenização
equivalente a seu valor; b) penais quando advinham de delitos.
A vítima postulava pela punição do crime, por meio de pena que podia
consistir em indenização equivalente ao dobro, triplo ou quádruplo
do dano causado; e, c) mistas quando as vítimas pediam, cumulativamente,
em ação única, uma sanção penal de ordem expiatória do corpo do infrator,
mais uma indenização de natureza civil pelo dano causado.
Aflora-se,
nesse período, a reparação do dano por ilícito civil com as ações penais,
reipersecutórias e mistas, que, no entanto, se limitaram a numerus
clausus nos termos da previsão legal. Posteriormente, a lex
poetelia papiria, humanizando a forma de reparação civil dos
danos injustos, estabeleceu que a garantia do cumprimento da obrigação
se assegurava no patrimônio do devedor, reconhecendo a dignidade da
pessoa humana, conforme arguta percepção do jurista Leonardo Grecco. O
terceiro período surgiu, mais tarde, quando o Estado se organizou e
assumiu a direção da ordem social, instituindo o oficial regime da
composição legal. A sanção de reparar os danos civis, a partir desse
estágio, assumiu as feições de imposição da ordem pública, no interesse
do lesado, mudando de convenção voluntária para obrigatória.
2.
LIBERDADE X RESPONSABILIDADE
A
responsabilidade proporciona o equilíbrio necessário entre os princípios:
da liberdade individual, do direito, da justiça e do instinto reflexo
de defesa.
2.1.
Propósitos no sistema legal: a) não prejudicar igual liberdade de ação da pessoa nem dos demais membros
da sociedade; e, b) impedir que sejam perpetradas lesões injustas
a interesses de ordem pública ou privada agrupando-se as normas no
direito penal e no direito civil.
2.2.
Finalidade normativa -
prevenir e punir a falta de diligência e prudência na ação violadora
da norma jurídica de maior ou menor potencial ofensivo a interesses
sociais ou privados. (art. 5º, caput, X e XII da CRFB/88).
2.3.
Falta e suas espécies -
Falta intencional ou não intencional penal (art.121 CP) e civil (artigos
186 e 927 do Código Civil e 5º, caput, X e XXII da CRFB/88).
2.4.
Confronto das liberdades de ações - Círculos concêntricos - v.g., atropelamento e morte
de um pedestre - violações das normas dos artigos 121, § 3º, do Código
Penal, 186 e 927 do Código Civil, recepcionados pelo artigo 5º caput,
X e XXII da CRFB/88.
3.
RESPONSABILIDADES PENAL E CIVIL - DISTINÇÕES:
Material
- interesse público e privado (ilícito absoluto ou relativo).
3.1.
Teorias do ilícito criminal - a) Teoria causal: fato típico, antijurídico e culpável; b) Teoria finalista:
o ilícito criminal se integra dos elementos objetivos do tipo penal
e da culpa, se não incidir causa justificativa de conduta (Damásio
E. de Jesus) . A configuração do tipo penal verifica-se em visão
global do fato, da conduta e a sua subsunção à norma legal.
3.2.
Hermenêutica -
O tipo de injusto na seara criminal torna indiciária a antijuridicidade
da conduta violadora da norma jurídica penal e civil, salvo elisão
por causa justificante da ação (art. 5º, caput, X e XXII da
CRFB/88 e arts. 186, 927 e p. único do CC/02).
3.3. Inexiste
diferença entre falta (culpa) civil ou penal, mas, de intensidade,
efeitos e critérios de aferições.
4.
SISTEMAS JURÍDICOS DAS AÇÕES PENAIS E CIVIS DE
SUPORTE FÁTICO COMUM
União.
Separação absoluta ou relativa. Adesão.
4.1. Sistema
da União. A falta do lesante a interesses públicos e privados
decorrentes de um só fato, indicava, na Antiguidade, uma unidade
de processo para as punições de ilícitos criminais e civis, como, v.g.,
ocorreu no direito romano. A experiência remanesce no México, Peru,
Bolívia.
4.2. Sistema
da separação desdobra-se em absoluto e relativo,
conforme haja ou não interferência da coisa julgada criminal sobre
o julgamento da lide civil, em questões de fato e de direito.
4.2.1. No
sistema da separação absoluta das ações penal e civil, a sentença
criminal condenatória acompanhada da prova que a alicerçou tem força
probante suficiente para engendrar a responsabilidade civil no juízo
cível , sendo adotado nos Direitos Germânico, Americano, Anglo-saxônico e
Holandês. Na Alemanha implantou-se tal sistema desde 30 de janeiro
de 1877, quando o § 14, apartado 2, inciso I, da Lei de Introdução
ao Código de Processo Civil (EGZPO)
4.2.2. No
sistema da independência ou separação relativa da ação civil
da penal, oriundas do mesmo fato delineia-se a separação da jurisdição
em penal e civil atribuindo-se competência própria a cada uma delas
para os julgamentos das respectivas lides, vinculando-se, no entanto,
o julgamento civil ao reconhecimento de questões de fato e de direito
do julgado criminal, com maior ou menor intensidade, no pressuposto
de possível contradição de julgados, conforme se verifica nas legislações
da Argentina, Chile, Colômbia, Espanha, Itália, França, Portugal e
do Brasil. O legislador estabelece a vinculação do Juízo cível
ao reconhecimento da prévia decisão criminal condenatória ou absolutória
(arts. 63 e 65 CPP do Brasil), com trânsito em julgado, nas assinaladas
questões de fato e de direito pressionado pelo ilusório entendimento
de que pode ocorrer contradição de julgados. Na prática, o conflito
de julgados não se verifica, porquanto os institutos da coisa julgada
e da litispendência não permitem a repetição do julgamento de uma
mesma causa. Observa-se ainda que as lides penal e civil não têm
a mesma natureza, finalidades e, principalmente, não se identificam
nos três elementos que caracterizam a repetição de ação: a identidade
de partes, dos pedidos e das causas de pedir: ativa e passiva.
4.3.
Sistema de adesão. A evolução do direito, em face da divisão
da jurisdição em penal e civil, com competências privativas dos juízos,
fez surgir o sistema de adesão, para atender as exigências
de economia processual. O legislador outorga competência ao juiz
criminal para decidir a lide civil, condicionada à prévia opção da
vítima em pleitear a reparação dos danos civis no processo penal
respeitando-se as competências absolutas dos juízos, para decidir
as respectivas lides decorrentes do mesmo fato. O sistema de adesão,
a despeito de causar delonga às definições das lides penal e civil,
proporciona maiores vantagens de ordem processual e material no direito,
como: economia processual, uniformidade de julgados, rapidez de
decisão sobre a reparação de danos. O sistema de adesão é adotado,
atualmente, em Portugal, Alemanha, França e
Itália.
4.4.
No Brasil, à época
do Império, o Código Criminal de 1830 adotou o sistema da união,
das ações penal e civil (artigo 31 do Código Penal), outorgando competência
ao juízo criminal para fixar a indenização (art. 269, § 5º do CPP),
revogado, no entanto, pela Lei nº 261, de 03.12.1841 (artigo 68).
4.5. Na
atualidade, vigora no Brasil o sistema da separação relativa das ações
penais e civis, em face do desdobramento das jurisdições criminal e
cível, mitigando-se com a outorga de competência, ao juízo criminal,
para homologar acordo quanto à lide civil, por meio de permissão em
lei especial (art. 74 da Lei nº 9.099/95). O legislador preocupou-se
com a contradição teórica de julgados em pontos de contato das ações
penal e civil de fato comum, vinculando o juízo civil ao reconhecimento
do julgado criminal de questões de fato e de direito, quando
decididas, anteriormente, pela jurisdição criminal em sentença transitada
em julgado, objetivando evitar contradição de julgados (artigos 935 do
Código Civil, 91, I, do Código Penal, 63, 65 e 66 do Código de
Processo Penal).
4.6. Não
obstante, o sistema jurídico brasileiro tende a evoluir para o sistema
de adesão tal como no direito comparado (Portugal, Alemanha, França
e Itália). Carece apenas de lei específica que autorize a parte civil
optar em demandar a reparação dos danos materiais e morais, perpetrados
em ilícito criminal, no processo penal ou no processo civil, dando
o primeiro passo, com a Lei nº 9.099/95, que regulamenta os procedimentos
nos Juizados Especiais Criminais e Civis no artigo 74, legitimando
a composição da reparação dos danos civis causados pelo ilícito criminal
no processo penal nos ilícitos de menor potencial ofensivo - pena máxima
não superior a 2 anos (Lei 11.313 de 28.06.2006), compreendendo contravenções
e crimes, inclusive ilícitos de trânsito (Lei 9.503/97), ainda que
ausente o MP, se previamente intimado, observando-se o limite da pena
máxima estabelecida (art. 61), excetuadas as leis com procedimentos
especiais. A disciplina da Lei nº 9.099/95 (arts. 58 e 93) permite,
ainda, ampliar-se a competência dos Juizados Especiais por lei estadual,
para fim de composição da lide civil em sede de processo penal. Tal
situação constitui um arremedo do processo de adesão, mas, já configura
um grande avanço legislativo.
5.EFEITOS
CIVIS DE SENTENÇAS CRIMINAIS
5.1.
A lei brasileira não outorga competência ao juiz criminal, na jurisdição
penal tradicional, para decidir a controvérsia civil de reparação de
danos, ao tempo em que transforma a sentença condenatória criminal
em título executivo judicial no cível (arts. 63 do CPP e 584, II do
CPC), ou impede o julgamento da lide de direito comum, por negativa
da autoria, do fato (art. 935 do CC) ou pelo reconhecimento de excludentes
de antijuridicidade (art. 65 do CPP), sem permitir, sequer, adesão
da parte civil no processo penal, situação que carece de correção legal.
Demais, entendeu o E. STJ que a reparação do dano resultante de prática
de crime constitui condição necessária à suspensão condicional do processo.
Pontue-se que a lei impõe a prévia intimação do acusado e ou responsável
civil para a prévia em audiência objetivando a composição dos danos
civis na esfera do processo penal, como condição indispensável à aplicação
do instituto da transação penal, sempre que se aquilatar a possibilidade
financeira do devedor, ainda, que o processo seja oriundo do JECRIM,
da esfera estadual ou federal, ut artigos 60 e 61 da Lei 9.099/95
e art. 2º. da Lei 10.259/01, com as alterações introduzidas pela Lei
11.313, de 28.06.2006, além de consolidar o enunciado criminal nº.
1, ao proclamar que o conceito de infração de menor potencial ofensivo
traduzido no art. 2º parágrafo único da Lei 10.259/01 (JEC-Justiça
Federal) abrange os delitos a que a lei comine pena não superior a
dois anos, e, por isso, se aplica, igualmente, no Juizado Especial
Criminal Estadual. Por isso, compete ao magistrado do Juizado especial
criminal no processo de crimes de danos de menor potencial ofensivo,
pena máxima não superior a 2 anos, notadamente, delitos culposos de
trânsito, diligenciar para efetivar o acordo da lide civil de reparação
dos danos civis, como condição necessária para a suspensão do processo
(arts. 74, 76, 88 e 89 da Lei 9.099/95, aproveitando-se da unidade
do fato e do procedimento, para decidir as duas lides penal e civil,
por meio de juízo único, em evidente economia processual. O acordo
avençado pelo devedor e credor em documento particular perante duas
testemunhas afigura-se válido e eficaz (art. 585, II do CPC) e a
fortiori se exarado em documento público perante o juízo, testemunhas
e o representante do Ministério Público.
5.2
- Disposições Legislativas. Sentença penal condenatória - Código Penal. Art. 91. São efeitos da
condenação: I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado
pelo crime... - Código de Processo Penal. Art. 63. Transitada em
julgado a sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução,
no juízo cível, para o efeito da reparação do dano, o ofendido, seu
representante legal ou seus herdeiros. Art. 65. Faz coisa julgada
no cível a sentença penal que reconhecer ter sido o ato praticado
em estado de necessidade, em legítima defesa, em estrito cumprimento
de dever legal ou no exercício regular de direito. Código civil.
Art. 935. A responsabilidade civil é independente da criminal; não
se podendo questionar mais sobre a existência do fato, ou quem seja
o seu autor, quando estas questões se acharem decididas no juízo
criminal.
6.
PROCESSO PENAL BRASILEIRO
Observações construtivas
No
processo penal brasileiro, não há ação civil, pedido da parte lesada,
nem a sentença criminal decide sobre a lide de natureza cível. Não
obstante, a sentença condenatória criminal constitui título executivo
judicial no cível, conforme a interpretação gramatical dos artigos
63 do CPP e 584, II do CPC. A absolvição pode ter efeito preclusivo
no juízo cível, na interpretação literal dos artigos 65 do CPP e 935
do Código Civil, quando assentada em motivos de fato e de direito,
nas hipóteses: a) negativa do fato ou da autoria (art. 386 do CPP);
e, b) legítima defesa, estado de necessidade, estrito cumprimento de
dever legal, exercício regular de um direito.
6.1. Em
sede de sentença absolutória no Tribunal do Júri, o fenômeno é o mesmo,
embora haja controvérsia na doutrina e jurisprudência, o julgado não
deve repercutir no campo da responsabilidade civil, exceto como instrumento
de prova, por falta de um pronunciamento específico sobre a controvérsia
civil, conforme doutrina no mesmo sentido, o eminente jurista e desembargador,
Carpena Amorim e cristalizado entendimento do E. STJ no Resp 26.975-RS,
Relator Min. Aldir Passarinho Junior, no entendimento de que " Nem
todas as hipóteses de absolvição no Tribunal do Júri levam à aplicação
das exceções previstas no artigo 935 do Código Civil quanto à impossibilidade
de apuração da existência do fato ou da sua autoria, em face da ressalva
constante do artigo 66 do CPP, norma mais moderna e prevalente. Assim,
se não firmada, categoricamente, a inexistência material do fato -
e aqui ele ocorreu - permite-se a investigação no cível da ocorrência
do dolo ou culpa que levaram à prática do ilícito gerador da obrigação
de indenizar...No r. voto do Min. Ruy Rosado de Aguiar, marcou-se,
tal posicionamento na expressão seguinte: "No caso, a sentença é do
Júri, que não é fundamentada. Uma das hipóteses do artigo 386 do CPP é a
da absolvição por falta de prova; e é pacífico que a absolvição por
falta de prova no juízo criminal não impede a condenação no juízo cível.
Então, no caso, pode-se permitir o reconhecimento da responsabilidade
civil porque a absolvição por negativa de autoria se deu por decisão
do júri, que não é fundamentada. Essa falta de fundamentação gera incerteza
quanto à real motivação do juízo decisório criminal, que poderia ter
sido a falta de prova. Os jurados podem ter dito, por maioria: não
há prova da autoria. Com isso, a decisão do júri se desqualifica
para submeter o juízo cível, não por ser uma decisão sobre a autoria,
mas por ser uma decisão sem fundamento explícito."
6.2. Adite-se
que, sem a outorga de competência ao juízo criminal para decidir a
matéria cível e a ausência desse pronunciamento efetivo na sentença
criminal, o julgado penal não poderia ter eficácia preclusiva no juízo
cível, obstando o julgamento de mérito da controvérsia de direito privado.
Essa falha legislativa, data máxima venia, deve corrigir-se
de lege ferenda, com a revogação pelo legislador dos
artigos seguintes: a) 935 do Código Civil, segunda parte (negativa
da autoria e do fato); b) 63 a 68 do CPP e 584, II do CPC, que se afiguram
de ilegitimidade constitucional, por violarem as normas do artigo 5º,
XXXIV (direito de petição), LIII (competência cível do juiz natural),
LIV (o devido processo legal), XXXV (não exclusão da apreciação do
Judiciário da lesão ou ameaça a direito) na medida em que esses dispositivos
impedem a parte civil de exercer o seu direito de ação, com resposta
jurisdicional de fundo, a respeito de seu pedido e violam ainda o princípio
do livre convencimento do juiz cível (art. 131 do CPC).
6.3. Argumentos
ponderáveis no plano axiológico da CRFB/88 em defesa dos interesses
da vítima inocente. Enquanto não se procede a correção legislativa
sugerida, no atual regime brasileiro existe possibilidade de solução
justa e adequada à luz da interpretação civil-constitucional, se
a alegação de eficácia preclusiva da coisa julgada criminal for utilizada
como chicana processual, em caso de prévia sentença penal condenatória
(art. 63 do CPP) ou para impedir a realização de Justiça, em grau
elevado, mediante prévia sentença absolutória por: a) negativa da
autoria ou do fato, com prova cível suficiente em sentido contrário;
ou b) excludente de antijuridicidade (v.g., situação
reconhecida como estado de necessidade na jurisdição criminal e inexigibilidade
de outra conduta na jurisdição civil, pelo STJ), argumentos que podem
ser afastados pelo julgador cível utilizando na hermenêutica a técnica
da interpretação sistemática direcionada a detectar o verdadeiro
conteúdo da norma jurídica, compatibilizando-a no plano axiológico
da Carta Magna ut artigos 1º., III, 5º, caput,
X e XXII da CRFB/88, que garantem a incolumidade patrimonial e extrapatrimonial
(ou moral) da pessoa inocente, como direitos fundamentais.
Nesse
diapasão, argumentos ponderáveis podem afastar o efeito preclusivo
da coisa julgada criminal que obsta o julgamento de mérito da lide
civil, impedindo que se perpetre flagrante injustiça à vítima ou seus
dependentes, na medida em que viola seu direito de ação garantido
na Constituição, com os fundamentos seguintes: a) o espírito das
normas expressas nos artigos 63, 65 do CPP (l'esprit de
loi - ratio legis) tem o sentido de facilitar o rápido acesso
da vítima ou dependentes à reparação dos danos injustos; b) a sentença
penal condenatória é apenas de natureza declaratória da obrigação de
reparar os danos civis (art. 91, I C. Penal), conforme doutrina de
Damásio de Jesus e Alfredo Buzaid, e do julgado do TJ-SP-
Ap. Cível nº. 84.403- Rel. Des. Ruy Camilo; c) o juiz criminal não
tem competência cível para decidir a lide civil (art. 5º, LIII da CRFB/88)
e, efetivamente, sobre ela não se pronuncia; d) a parte civil não exerceu
o direito de ação no processo penal (art. 5º, XXXIV, CRFB/88), podendo,
em conseqüência, pleitear a reparação dos danos de natureza cível e
com direito a uma decisão de mérito sobre seu pedido; e) as partes,
as causas de pedir, ativa e passiva e os pedidos nas ações penal e
civil não se identificam situação que não caracteriza a litispendência
nem a coisa julgada criminal impeditiva do julgamento de mérito da
conexa, mas, heterônoma ação de reparação civil; f) os limites subjetivos
da coisa julgada criminal impedem o efeito preclusivo a quem não foi
parte no processo penal (art. 472 do CPC - res inter alios acta); g)
não existe contradição prática de julgados porque os juízos criminal
e civil decidem controvérsias distintas, nos limites de cada competência,
não havendo duplo pronunciamento sobre as mesmas lides; h) os pleitos
de reparações dos danos materiais e morais (art. 5º, caput,
X CRFB/88) não foram objeto do julgamento no processo penal, não se
podendo extravasar o limite objetivo da coisa julgada criminal às questões
de fato e de direito, que se destinam à preclusão processual (art.
469, I CPC) e não à formação da res judicata, não podendo,
por isso, impedir o julgamento da lide civil pelo juiz competente.
6.4. Assim,
nas hipóteses necessárias, o julgador cível na hermenêutica integrará a
norma infraconstitucional com os valores máximos do plano axiológico
da CRFB/88, na salvaguarda dos interesses jurídicos da vítima inocente
convertendo o direito em JUSTIÇA.
Notas
de Rodapé
1 Alves, José C. Moreira. Direito Romano, p. 293-294.
2 Greco, Leonardo. O Processo de Execução, p. 14-15. A
lex Poetelia (326 a.C.) ...representou , assim, o início da decadência
da execução pessoal, abrindo caminho para a execução
patrimonial, e o reconhecimento de que a vida humana e a integridade
física, valores humanos inalienáveis, não podiam
ser sacrificadas em benefício de credores de obrigações
pecuniárias.
3 Art. 186. Aquele que, por ação ou omissão voluntária,
negligência, ou imprudência, violar direito, ou causar dano
a outrem, ainda que exclusivamente moral, comete ato ilícito.
Art. 927. Aquele que, por ato ilícito (arts. 186 e 187), causar
dano a outrem, fica obrigado a repará-lo.
4 Jesus, Damásio E. Direito Penal, p. 216 e 220-221. ...Welzel
entendeu que não somente a intenção, como também
o dolo, nesses casos, pertencem à ação e ao tipo.
Se nos crimes com elementos subjetivos do injusto, o dolo pertence à ação
e ao tipo penal, por que nos outros crimes sem esses elementos, pertenceria à culpabilidade?
Diante disso, segundo a doutrina finalista da ação, a teoria
reinante teve por necessidade incluir o dolo na ação (conduta)
e no tipo penal... somente após a análise do conteúdo
da vontade é que posso afirmar que houve determinado tipo penal.
Em face disso, a vontade final, isto é, o dolo, faz parte do tipo.
O dolo funciona como elemento subjetivo do tipo. A figura típica
possui duas partes: uma subjetiva, de cunho final, e outra objetiva,
de natureza causal, dirigida por aquela. Em conseqüência,
o dolo é retirado da culpabilidade, não constituindo espécie
(teoria psicológica) ou elemento da culpabilidade (teoria psicológico-normativa),
mas elemento subjetivo do tipo, integrando a conduta, primeiro elemento
do fato típico... Quanto à culpa, nos termos da tese de
Welzel, la inobservância del cuidado objetivo pertenece a lo injusto
de los delitos culposos. Assim, no crime culposo, a conduta descrita
no tipo ("o homicídio é culposo") está integrada
pela inobservância do dever de diligência na vida de relação.
Quem tem habilidade para cometer uma conduta "adequadamente",
deve executá-la "adequadamente". Aquele que não
possui tal habilidade deve abster-se de praticar o comportamento desejado. "Com
o comportamento adequado que assim se estabelece, deve ser comparado
o efetivo comportamento do agente, para verificar-se se ele é típico
no sentido de um crime culposo": toda ação que não
corresponder a tal comportamento adequado é típica no sentido
do crime culposo.
5 Abreu, Roberto. A Sentença Criminal e a Responsabilidade Civil. p. 95-115. Código Penal do México, Art. 34: A sanção
civil assume o caráter de sanção penal, equiparada à multa,
sendo exigível de ofício pelo Ministério Público.
Direito peruano, Arts. 65 do Código Penal e 261 do Código
de Procedimento Criminal. O direito boliviano considera a reparação
civil como pena, arts. 3º, 261 e 382 do Código de Procedimento
Criminal.
6 Rosenberg, Léo. Tratado de Derecho Processual Civil. p. 72-73.
7 Liebman, Enrico Tullio. Eficácia e Autoridade da Sentença,
p. 261-262.
8 Revista Veja, edição de 12 de fevereiro de 1997, p. 36, "Notícias
Forenses". Comentário de Luiz Flávio Borges D'Urso.
Rio de Janeiro, março 97, p. 30. Exemplo da independência
das ações penal e civil decorrentes do mesmo fato no direito
americano tem-se no caso O. J. Simpson, ex-astro de futebol americano,
que foi condenado, civilmente, a pagar uma indenização
de 8,5 milhões de dólares à família da ex-mulher,
embora tenha sido absolvido, criminalmente, por negativa de autoria.
No ponto de vista jurídico americano, não existe paradoxo
no fato de ter sido absolvido na esfera criminal e condenado na civil.
No processo criminal, o réu somente pode ser declarado culpado
se houver provas plenas contra ele e, no cível, a condenação
pode ser ensejada, por fortes evidências ou indícios.
9 Moreira, José Carlos Barbosa. "Apontamentos para um estudo
sobre a reparação do dano causado pelo crime e os meios
de promovê-la em Juízo", p. 111.
10 Goldschmidt. Breviários de Derecho II, p. 184.
11 Tornaghi, Helio. Instituições de Processo Penal, p.
438.
12 Código Civil de la Republica Argentina. 4ª ed. Buenos
Aires: AZ Ed. /s.d./ p. 255-258, arts. 1.096, 1.101-1.104.
13 Código de Procedimento Penal. 4ª ed. Santiago: Jurídica
do Chile, /s.d./arts. 13, 14 e 30.
14 Código de Procedimento Penal. Bogotá: Temis, arts. 24,
27, 30.
15 Ley de Enjuiciamiento Criminal. 3ª ed. Madri: Civita, arts. 4-6
, 111-112, 115-116.
16 Código Processo Penal Italiano. 4ª ed. Napoli: Jovene,
arts. 24-27.
17 Petits Codes Dalloz. 8ª ed. Paris: Jurisprudence Generale, arts.
3-4, 10.
18 Código Processo Penal de Portugal. 3ª ed. Coimbra: Coimbra
Ed., arts. 30, §§ 1º e 2º, e 34.
19 Código Civil Brasileiro. Art. 935. Código Penal. Art.
74, I. Código de Processo Penal. Arts. 63 e 65.
20 Portugal. O artigo 34 do Código de Processo Português permite ao lesado adotar o processo de adesão para viabilizar
a reparação dos danos civis; há, no entanto, um
peso de oficialidade, por autorizar a condenação civil
do réu, em processo penal, pelo juiz criminal, sem pedido ou constituição
do ofendido em parte civil. Na hipótese de condenação,
segundo o art. 34: Reparação por perdas e danos. O juiz,
no caso de condenação, arbitrará aos ofendidos uma
quantia como reparação por perdas e danos, ainda que lhe
não tenha sido requerida...
21 França. Adota-se o processo de adesão, na medida em
que a parte civil pode demandar o pedido de reparação juntamente
com a ação penal perante a jurisdição criminal,
por autorização do art. 3º do Code de Procedure
Pénale,
do teor seguinte: L'action civile peut être exercée en même
temps que l'action publique et devant la même jurisdiction. Elle
sera recevable pour tous chefs de dommages, aussi biens matériels
que corporels ou moraux, que découleront des faits objets de la
poursuite.
22 Itália. O artigo 23 do Codice di Procedura Penale permite que
a parte civil exerça sua pretensão no processo penal: Art.
23. Esercizio dell'azione civile nel procedimento penale. Le persone
indicate nella prima parte dell'articolo precedente possono exercitare
l'azione civile nel procedimento penale, constituendose parte civile.
Tuttavia il giudice penale non può decidere sull'azione civile,
quando il procedimento si chiude con sentenza che dichiara non doversi
procedere (378,379) o che pronuncia assoluzione per qualsiasi causa (478,
479, 489).
23 Código civil. Art. 935. A responsabilidade civil é independente
da criminal; não se podendo questionar mais sobre a existência
do fato, ou quem seja o seu autor, quando estas questões se acharem
decididas no juízo criminal.
24 Código Penal. Art. 91. São efeitos da condenação:
I - tornar certa a obrigação de indenizar o dano causado
pelo crime...
25 Código de Processo Penal. Art. 63. Transitada em julgado a
sentença condenatória, poderão promover-lhe a execução,
no juízo cível, para o efeito da reparação
do dano, o ofendido, seu representante legal ou seus herdeiros. Art.
65. Faz coisa julgada no cível a sentença penal que reconhecer
ter sido o ato praticado em estado de necessidade, em legítima
defesa, em estrito cumprimento de dever legal ou no exercício
regular de direito.
26 Lei nº 9.099, de 26 de setembro de 1995 (Juizados Especiais Cíveis
e Criminais), art. 74. A composição dos danos civis será reduzida
a escrito e, homologada pelo Juiz mediante sentença irrecorrível,
terá eficácia de título a ser executado no juízo
civil competente. Art. 75. Não obtida a composição
dos danos civis, será dada imediatamente ao ofendido a oportunidade
de exercer o direito de representação verbal, que será reduzida
a termo.
27 Lei 11.313, de 28.06.2006.Art. 61.Consideram-se infrações
penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções
penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior
a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.
Art. 60. O Juizado Especial Criminal provido por juízes togados
ou togados e leigos, tem competência para a conciliação,
o julgamento e a execução das infrações penais
de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão
e continência. P. único. Na reunião de processos,
perante o juízo comum ou tribunal do júri, decorrentes
da aplicação das regras de conexão e continência,
observar-se-ão os institutos da transação penal
e da composição dos danos civis. Igual alteração
operou-se no art. 2º. e parágrafo único da lei 10.259/2001,
por força da lei 11.313 de 28.06.2006.
28 Enunciado Criminal 22- " Não havendo interesse de menores
ou incapazes, não é nula a decisão que homologa
composição dos danos civis se, devidamente intimado, o
Ministério Público não houver comparecido à audiência
preliminar". Caderno de Jurisprudência JUIZADOS ESPECIAIS
7, p. 94 - Editora Espaço Jurídico. Rio. Dezembro 2003.
29 Lei 11.313, de 28.06.06. Art. 1º. Os arts. 60 e 61 da Lei nº 9.099,
de 26 de setembro de 1995, passam a vigorar com as seguintes alterações:..." Art.
61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo,
para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os
crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2
(dois) anos, cumulada ou não com multa."
30 STJ. 5. Turma - RESP 566664 - Min. Rel. Laurita Vaz - Unânime-
Julg. 03.08.2004 - DJ 11.10.2004. Recurso Especial. Penal. Crime de usura.
Lei n. 1.521/51. Suspensão condicional do processo. Condição
obrigatória. Reparação do dano. Inteligência
do art. 89, p. 1º, inciso I, da Lei 9.099/95. 1. Esta Corte entende
que a reparação do dano é condição
necessária para concessão do sursis processual, salvo na
impossibilidade de fazê-lo de maneira justificada. Precedentes.
2. Cabe ressaltar que a obrigação de reparar o dano decorre
da prática do crime. Na hipótese vertente, a suspensão
condicional do processo decorre da prática do crime do art. 4º.,
alínea a, da Lei n. 1.521/51, que trata da cobrança de
juros superiores à taxa permitida em lei, não se vinculando à posse
e propriedade de determinado bem litigioso.
31 Enunciado criminal 1. " Aplica-se ao Juizado Especial Criminal
Estadual o conceito de infração de menor potencial ofensivo
32 Art. 386 do CPP -"O juiz absolverá o réu… I
- estar provada a inexistência do fato; II - não haver prova
da existência do fato;..não constituir o fato infração
penal;IV - não existir prova de ter o réu concorrido para
a infração penal; v) existir circunstância que exclua
o crime ou isente o réu da pena (arts.17, 18, 19, 22 e 24, p.
1o. do Código Penal."
33 Esse é o quadro que transparece na interpretação
literal das normas jurídicas referidas, embora haja entendimento
diverso que será analisado no desenvolvimento deste tema.
34 Amorim, Carpena. A Reparação do Dano Decorrente do Crime,
p. 275: ...Afigura-se-nos que as deliberações do Tribunal
do Júri não possuem os pressupostos necessários
a legitimar a obrigatória interdependência das decisões
das duas esferas, a criminal e a civil, posto que as sentenças
proferidas pelo Tribunal Popular não podem, de modo algum, influenciar
nas decisões cíveis, porque tal inferência só é admissível
nos limites da lei e quando se trata de soluções penais
proferidas pelo juízo singular.
35 Superior Tribunal de Justiça - Resp. 26.9075-RS - 4a.Turma.
Relator Min. Aldir Passarinho Júnios, ac. Publicado em 20.05.2002.
COAD- Informativo semanal 29/2002, p. 500/502.
36 Abreu, Roberto. Ob. cit., p. 91-169.
37 Amorim, Carpena. Responsabilidade Civil e o Júri, p. 60-65:
A sentença do Júri, como é da essência dos
julgamentos do Tribunal popular, é imotivada... Se a eventual
prevalência da decisão criminal sobre a jurisdição
civil não se alicerça sobre os valores que disciplinam
a coisa julgada material, mas sobre a coerência que deve existir
nos pronunciamentos judiciais através dos seus diversos canais,
não há nenhum obstáculo que se oponha à revisão
da prova pelo Juiz do Cível, mesmo em se tratando de autoria do
crime, porque, na sua fundamentação não há contradição
alguma com a decisão imotivada do Tribunal popular. Santos, J.
M. de Carvalho. Código Civil Brasileiro Interpretado, p. 298-301/303:
O Supremo Tribunal Federal possui caso típico, em que havendo
absolvição pelo júri, mas tendo existido a pronúncia
(indícios veementes) se deferiu a indenização (com.
ao art. 1.525, citando outros autores). Em se tratando de decisão
proferida pelo júri, nenhuma influência sobre a ação
cível pode ela exercer, mesmo que o réu tenha sido absolvido
por ter ficado provada a não existência do fato ou que outrem
foi o seu autor. Afinal, sobre o tema, conclui: Ora, na decisão
do júri, quer a que não está fundamentada, ou que
foi proferida sem ser de modo circunstanciado, quer a que foi dada em
completo desacordo com a prova dos autos, em virtude de sua apregoada
soberania, não deparamos os elementos característicos de
uma sentença que possa exercer qualquer influência sobre
a instância cível, por emanar de uma jurisdição
toda especial, exercida fora das normas regulares de Direito. Nem seria
lógico que a justiça ficasse à mercê desses
atos de prepotência judiciária, contrários à lei.
38 Dias, José de Aguiar. Ob. cit., p. 487-488: O art. 65 do Código
Penal estabeleceu confusão, ao dizer que a sentença penal
fundada em estado de necessidade, legítima defesa, estrito cumprimento
de dever legal ou exercício regular de direito, faz coisa julgada
no cível; em nota de rodapé (1.555), acrescenta: Raramente,
a prescrição cível coincide com a criminal. É claro
que, se ocorre a coincidência, a solução será idêntica.
Idêntica, não única. A sentença criminal não
tem efeito preclusivo, não basta ao julgamento cível. É preciso
que a jurisdição cível aplique a prescrição
cível.
39 Superior Tribunal de Justiça. Min. Eduardo Ribeiro. REsp nº 27.806-9-RJ
(92.0024871-3): Sentença criminal absolutória. Coisa julgada.
Efeito preclusivo relativamente a pretensão indenizatória.
A regra geral é a não vinculação de um juízo
ao outro, tratando-se de absolvição na esfera criminal.
As exceções são as previstas nos artigos 65 e 66
do Código de Processo Penal. A inexigibilidade de outra conduta,
causa supralegal de exclusão da culpabilidade, não se inclui
entre aquelas que, reconhecida no juízo criminal, imponha-se ao
cível. Impossibilidade de aplicação analógica
do disposto no artigo 65 do CPP.
40 Jesus, Damásio. Ob. cit., p. 596. Liebman, Enrico Tullio. Processo
de Execução, p. 68. Buzaid, Alfredo. Do
Concurso de Credores no Processo de Execução, p. 311.
41 15aCC do TJ-SP. Ap. Cível nº 84.403-São José do
Rio Preto. Rel. Des. Ruy Camilo. Apelação julgada procedente,
por unanimidade, em 23/4/1987. Não se cogita de cobrança
de cheque e sim de ação de ressarcimento de danos, à vista
de ato ilícito cometido pelo réu, fato pelo qual, aliás,
foi condenado criminalmente por decisão com trânsito em
julgado. A propósito do tema em debate, observa o ilustre magistrado
carioca, Roberto Abreu, que a sentença penal condenatória é de
natureza apenas declaratória, quanto à certeza de reparar
o dano, por parte do autor da infração. Sendo declaratória,
no nosso sistema jurídico processual, jamais poderia constituir-se
em título executivo, que é peculiar às sentenças
de natureza condenatória (A Sentença Criminal e a Responsabilidade
Civil, p. 125). Por isso mesmo, não se podendo cogitar de cobrança
executiva, optou o autor por ação onde formulou pretensão
de caráter indenizatório, objetivando ressarcir-se dos
danos que decorreram do ato ilícito penal cometido pelo apelante.
42 Divinópolis. Rel. Juiz Maurício Delgado. Em 31/8/1982
(JB 75, p. 157-164). Coisa Julgada. Limites Subjetivos. Sentença
Criminal. Extensão no Juízo Cível. São os
limites subjetivos e não os objetivos do julgado que impedem uma
questão decidida no juízo criminal atingir o cível
revestida com a autoridade de coisa julgada. Apesar de a legislação
brasileira dar o caráter de título executivo à sentença
penal, deve-se, no entanto, agir com muita cautela na extensão
dos efeitos do julgado criminal ao cível, uma vez que tal sistema
processual está em dissonância com o princípio dos
limites subjetivos do julgado.
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